Há seis meses, aos pés do Cristo Redentor, Terezinha da Conceição, de 80 anos, abriu a campanha de vacinação contra a Covid-19 no Rio, numa cerimônia lotada de autoridades. A idosa foi a primeira dos 6,8 milhões de fluminenses que receberam pelo menos uma dose do imunizante nos 182 dias desde então. Moradora do abrigo Cristo Redentor, uma das primeiras casas de repouso escolhidas para receber os lotes iniciais no estado, Terezinha não se deixou assustar com os espirros que andou soltando na última semana. Segura do efeito da vacina, com tranquilidade aguardou que os sintomas de resfriado fossem embora — e foram. Por videochamada, impedida de receber visitantes devido à variante Delta, ela chora ao sentir saudades dos amigos, das aulas de dança, do cursinho de artesanato. Mas faz questão de destacar um dos efeitos da imunização: a paz de espírito.
— Digo ao mundo inteiro: tomem a vacina. Não vá pela conversa de uns e de outros — recomenda.
‘Vemos mortes de pessoas jovens’
O impacto da vacinação é acompanhado de perto pela técnica de enfermagem Dulcineia da Silva, de 60 anos, que trabalha no Hospital Municipal Ronaldo Gazolla, que tem a maior UTI pública para pacientes com Covid do Rio. Ela lembra quando foi pela primeira vez ao Cristo Redentor, justamente para tomar a vacina, assim como Terezinha. Nos últimos meses, viu o perfil de internados mudar e ficou surpresa ao ter que cuidar de tantos jovens infectados.
— Vemos mortes de pessoas jovens. É algo que não conseguimos nos acostumar. Se quem não usa máscaras e aglomera visitasse uma UTI Covid, repensaria ao desrespeitar as regras — alerta.
Seis meses depois daquela picada, ela diz ter esperança de dias melhores. Mesmo certa da eficácia da vacina, não abandonou as medidas de proteção:
— Não é porque tomei a vacina que vou abusar. Você pode ainda ter o vírus e transmitir para quem você mais ama. Vejo na rua gente sem máscaras, e isso é revoltante.
Sem baixar a guarda
Apesar dos bons sinais, a campanha de vacinação no estado deixou buracos — que podem ser fatais frente à chegada da variante Delta, a mais transmissível já catalogada pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Apenas 39 dos 92 municípios fluminenses atingiram 90% dos idosos imunizados com ao menos uma dose. No estado, mais de 600 mil pessoas podem estar com a injeção de reforço atrasada. Os dados foram compilados pelo epidemiologista Guilherme Werneck, pela sanitarista Ligia Bahia, ambos da UFRJ, e pelo médico Mário Scheffer, da USP.
— Houve um problema específico no Rio no início da vacinação, principalmente na Baixada. O Rio teve uma desorganização singular, a gente sabe disso — afirmou Ligia Bahia.
A cada injeção no braço do carioca, o Rio avança um passo na retomada do “velho normal”. Bares e restaurantes funcionam sem restrição, praias e shoppings estão liberados e quase 100% das escolas já reabriram. O prefeito Eduardo Paes já planeja o réveillon e o carnaval. Dados de mobilidade do Google para todo o estado apontam uma aumento na circulação de pessoas, que se aproxima dos níveis de antes da pandemia. Mas o momento ainda deve ser de cautela.
O secretário municipal de Saúde, Daniel Soranz, diz que “é difícil” controlar a circulação na cidade no contexto atual, mas que é não possível baixar a guarda: as regras sanitárias devem ser mantidas, principalmente, com a chegada da Delta ao Rio.
Nenhum comentário:
Postar um comentário