A CPI da Covid aprovou a quebra de sigilo fiscal de Ricardo Barros (PP-PR), líder do governo na Câmara, e também do advogado Frederick Wassef, que atua para o presidente Jair Bolsonaro e para um de seus filhos, o senador Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ).
Os requerimentos preveem que a Receita Federal repasse as movimentações de Barros e Wassef referentes aos últimos cinco anos.
O argumento usado pelo relator da CPI, senador Renan Calheiros (MDB-AL), é que eles foram citados em depoimentos colhidos e em documentos. Os dados ajudariam a esclarecer as informações já levantadas.
"As pessoas acima relacionadas possuem registros de passagens de recursos ou relacionamentos comerciais com origem, ou destino na empresa Precisa Medicamentos, seus sócios, familiares destes e outros investigados por esta CPI", aponta trecho da justificativa de Renan.
A comissão também quebrou o sigilo do Centro de Educação Profissional Técnico Maringá, entidade da qual Barros detém participação. Os senadores desconfiam que o deputado pode ter recebido repasses de empresa investigada pela CPI por meio dessa entidade.
Dos 187 requerimentos, 120 são pedidos de quebra de sigilo e solicitam relatórios de inteligência ao Coaf, órgão de inteligência financeira. Houve também a aprovação da quebra de sigilos telefônico, fiscal, bancário e telemático da Global Gestão em Saúde e o sigilo fiscal de Francisco Maximiano, sócio-administrador da Precisa, que intermediou a compra da vacina indiana Covaxin pelo Ministério da Saúde.
A pedido dos governistas, os senadores votaram em separado, mas também aprovaram as quebras de sigilo de blogueiros bolsonaristas, como Allan dos Santos e Leandro Ruschel, e de canais de apoio ao presidente. Foram quebrados os sigilos de veículos, como Brasil Paralelo e Senso Incomum.
Os requerimentos foram aprovados nesta quinta-feira (19) pouco antes do depoimento de Maximiano. Ele optou por ficar em silêncio na maioria dos questionamentos dos senadores.
Nas poucas perguntas a que respondeu, Maximiano fez questão de negar que tivesse articulado com Barros a elaboração de uma emenda que permitiu que vacinas aceitas pelas autoridades sanitárias indianas pudessem obter a mesma autorização no Brasil.
Já no início do depoimento, a defesa de Maximiano disse que o depoente não iria usar seus 15 minutos introdutórios e que iria deixar de responder às perguntas que avaliasse que poderiam produzir provas contra si.
Ele também não aceitou o compromisso de apenas dizer a verdade durante o seu depoimento. Maximiano obteve um habeas corpus do STF (Supremo Tribunal Federal) que garante o direito ao silêncio e mesmo mentir para não se incriminar.
Após o depoente ficar em silêncio na maioria dos questionamentos, os senadores começaram uma discussão sobre o seu habeas corpus. Membros da CPI sugeriram até sua prisão.
"Segue as perguntas e se algum senador entender que está criando obstáculo efetivo avisa e parte para aquilo que a gente já fez na CPI", disse o senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE).
Ao falar sobre Barros, Maximiano disse que conhece o deputado, mas negou que tivesse negociado com ele a elaboração e apresentação da emenda.
"Quando eu digo que era do interesse [da Precisa], porque, por óbvio, ela tornava a Covaxin elegível também, assim como outras de outras autoridades. Mas não houve absolutamente nenhum contato com o deputado Ricardo Barros, tampouco com outro pra se fazer essa inclusão", afirmou.
Maximiano disse que as fraudes em documentos entregues ao Ministério da Saúde, na negociação envolvendo a Covaxin, foram cometidas pela Envixia, uma atravessadora dos Emirados Árabes.
Maximiano foi questionado pelo senador Humberto Costa (PT-PE) sobre o motivo de ter viajado à Índia logo após o surgimento de irregularidades.
O empresário disse que viajou para o país asiático para mostrar à farmacêutica Bharat Biotech, fabricante da Covaxin, os documentos que havia recebido da Envixia, para comprovar que a fraude veio daquela empresa.
Costa afirmou que tinha provas de que as manipulações ocorreram dentro do ministério. O advogado de Maximiano respondeu que o arquivo original encaminhado contém dados da Envixia, onde estariam as fraudes, e não em manipulações no ministério.
Em um outro momento, a senadora Simone Tebet (MDB-MS) mostrou um ofício enviado pela CGU (Controladoria-Geral da União) para o Ministério da Saúde. O documento apontou que quatro memórias de reunião, nas quais foram tratados preços da Covaxin, foram omitidas do processo de compra da vacina.
"Nesse contexto, observou-se que parte significativa dos documentos enviados em resposta ao requerimento de informação, em especial as quatro memórias de reunião, foram omitidos do processo, em que pese tratar-se de informações críticas à aquisição relacionada, devendo, assim, estar formalizadas no processo de aquisição autuado pelo gestor para essa finalidade", afirma o ofício, datado de 5 de julho e assinado pelo diretor de auditoria em políticas sociais da CGU, José Paulo Julieti Barbiere.
Dois senadores chegaram a apontar mentiras no depoimento de Maximiano.
Renan questionou-o sobre reunião com o presidente do BNDES, Gustavo Montezano, que teria sido intermediada pelo senador Flávio Bolsonaro. Maximiano respondeu que se tratava de um projeto de internet para o Brasil, da empresa Xis Internet Fibra. Renan indagou se a Xis transferiu recursos para a Precisa, e o depoente respondeu que não.
Após algumas horas, Renan retomou o assunto e apontou um documento fiscal que mostra repasse da empresa para a Precisa. O relator, no entanto, não pediu providências, como solicitar a prisão do depoente.
"Queria dizer que encontra-se em poder desta CPI o registro de uma transferência de R$ 640.444,52 entre 8 de novembro de 2021 e 16 de abril de 2021 feito da Xis exatamente para a Precisa, diferente do que respondeu o depoente ao interrogatório", disse Renan.
Mais tarde, Maximiano se retratou de uma informação apontada como mentirosa por Vieira, que chegou a pedir a prisão do depoente por falso testemunho.
O senador apontou que Maximiano disse ser apenas o "fiador" de um contrato de locação de imóvel que seria usado por Marcus Tolentino, apontado pela CPI como sócio oculto do Fib Bank, banco que deu a garantia para a compra da Covaxin.
O depoente depois da intervenção e do pedido de prisão se retratou e assumiu ser o locatário.
"O senador Alessandro, com toda a formação jurídica que tem, sabe que investigado não comete falso testemunho, ainda que falte com a verdade. Dois: ainda que não fosse na condição de investigado, e sim de testemunha, ele teria até o relatório final para se retratar. Três: ele já estava pronto para fazer isso", afirmou o advogado de Maximiano.
"Eu formalmente me retrato e peço desculpas porque realmente consto como locatário", disse o empresário.
No início da sessão desta quinta, Renan disse que o relatório final pretende responsabilizar por crime comum todos os membros do gabinete paralelo, que assessorava Bolsonaro em temas relativos à pandemia. Como o jornal Folha de S.Paulo mostrou, o grupo participou de ao menos 24 reuniões no Palácio do Planalto e no Palácio da Alvorada.
"Pretendo como relator é responsabilizar por crime comum todos os membros do gabinete paralelo pela maldade que fizeram contra o Brasil, por prescrever remédios ineficazes."
A declaração foi dada após ser questionado sobre o vazamento do documento. Renan alegou que o relatório ainda não está pronto e negou que os membros do gabinete serão responsabilizados pela demissão de ministros.
"Não há nada, inclusive, com relação ao dado citado que nós iremos atribuir aos membros do gabinete paralelo a responsabilidade pela demissão dos ministros. Eu jamais vou atribuir isso."
Nenhum comentário:
Postar um comentário