Protestos não têm líder direto nem o apoio de toda a
categoria; parte dos caminhoneiros apoiam Lula e são contra a paralisação.
Pouco tempo após a vitória de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ser confirmada no
segundo turno das eleições presidenciais contra Jair Bolsonaro (PL), grupos de
caminhoneiros bolsonaristas e outros apoiadores do atual presidente começaram a
fechar rodovias. Até as 23h do dia 31 de outubro, de acordo com a PRF (Polícia
Rodoviária Federal), havia bloqueios parciais ou totais em 25 Estados
(incluindo o Distrito Federal). Os únicos onde não havia registros de
ocorrências eram Alagoas e Amapá.
Em nota, a PRF afirma que acionou a AGU (Advocacia-Geral da
União) para conseguir liberar estradas bloqueadas e diz que adotou todas as
providências para o retorno da normalidade do fluxo nas rodovias afetadas. A
proporção dos protestos não se alastrou como na greve de 2018, mas causa
preocupação em partes do país por fazerem com que algumas rodovias sejam
completamente bloqueadas, provocando engarrafamento de mais de 12 horas.
Na noite de segunda-feira, a Confederação Nacional dos
Trabalhadores em Transportes e Logística (CNTTL) publicou uma nota de repúdio
aos protestos, classificando-os como "antidemocráticos".
"Vivenciamos uma ação antidemocrática de alguns segmentos que não
representam a categoria dos caminhoneiros autônomos de não aceitação do
resultado das urnas. Precisamos respeitar o que o povo decidiu nas urnas: a
vitória de Luís Inácio Lula da Silva", diz o texto, em nome do diretor da
CNTTL, Carlos Alberto Litti Dahmer, que é caminhoneiro autônomo de Ijuí (RS).
'Posicionamento do presidente é que determinará rumo dos
protestos' Janderson Maçanero, caminhoneiro de Itajaí (SC) conhecido como
Patrola, que faz parte dos protestos atuais, diz que, na sua cidade, a
movimentação é composta apenas por 20% de caminhoneiros, e o restante dos
manifestantes são cidadãos de diferentes profissões. O cenário, com o propósito
de não aceitar um novo presidente, é diferente de outros que o caminhoneiro
participou, como em 2014, uma paralisação feita para reivindicar queda nos
preços de combustíveis, e em 2019, pela contratação direta de caminhoneiros sem
terceiros que intermediassem valores.
Ele afirma também que os protestos não têm liderança direta
ou reivindicação específica, alguns, por exemplo, defendem um golpe de Estado
conduzido pelos militares, que ele diz não ser o seu caso, mas todos têm, em
comum, a rejeição a Lula e a não aceitação da vitória do petista nas eleições.
"É o posicionamento do presidente que determinará rumo dos protestos e o
posicionamento da categoria. Estamos esperando-o falar. Ou Bolsonaro vai à
guerra, ou ele se extinguirá do cenário político, porque aí ele não é o líder
que pensávamos.
Patrola afirma que "ir à guerra", para ele, é não
aceitar o resultado, mas não descreve exatamente como isso poderia se
desenrolar, já que ele próprio diz não apoiar um golpe militar. Ele diz
aguardar que o presidente anuncie a solução.
A aceitação dos resultados por parte de Bolsonaro,
complementa, seria uma decepção para ele e para muitos de seus colegas. Sobre
quanto tempo a paralisação poderia durar, ele diz que "tempo é
relativo" para os caminhoneiros. "Aqui estamos em casa. Nosso
caminhão tem onde comer, onde dormir... Esse é o nosso cotidiano."
'Acredito que a categoria não terá dificuldade em negociar
com o governo Lula' Wanderlei Dedeco, caminhoneiro de Curitiba, Paraná, que
atua como "conselheiro" das lideranças dos caminhoneiros, segundo sua
própria descrição, se diz contra as paralisações e afirma que até o começo do
dia, não acreditava que os protestos durariam por muito tempo, mas já passou a
ver o cenário com "outros olhos”
"As manifestações estão crescendo rapidamente, e não
tem uma intervenção imediata da PRF como houve em outras ocasiões. Além disso,
a demora de Bolsonaro para se pronunciar pode contribuir para que os protestos
se alastrem”.
"Os protestos estão sendo feitos por caminhoneiros
revoltados, que não aceitam perder, e por empresários - nos locais você só vê
'carrões' - que acreditam que vão perder algo com o governo Lula. Mas a
democracia marcou presença ontem, é assim que funciona o jogo." Dedeco foi
uma das lideranças da greve de caminhoneiros de 2018, e diferentemente dos
caminheiros ativos nos protestos, apoiou Lula no segundo turno das eleições.
"Já fui um crítico do PT e do Lula, acreditei na
Lava-Jato. Mas se o STF não o condenou, quem sou eu para fazer isso? Eu votei
no Lula e agora quero ver ele governar. Se ele fizer algo errado, pode ter
certeza que eu vou criticar, diferentemente dos bolsonaristas que ficaram
'endeusando' Bolsonaro e aceitavam tudo de errado que ele fazia." Na
opinião dele, os caminhoneiros tendem a ser beneficiados com a eleição de Lula.
"Com o governo Bolsonaro não havia condições para sentar e negociar. Já o
governo de Lula sempre foi mais democrático, aberto a ouvir o que estava bom e
o que não estava. Acredito que a categoria não terá dificuldade em negociar com
o governo Lula", diz.
https://www.bbc.com/portuguese/brasil
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