Ministério Público encontrou esquemas de fraudes, propinas e desvios de dinheiro na gestão do prefeito Evandro Capixaba.
O repórter secreto do Fantástico vai investigar por que uma cidade de menos de 40 mil habitantes precisa comprar 1,8 milhão de sacos de lixo. Essa cidade é Mangaratiba, no estado do Rio, onde o prefeito está sendo investigado por fraudes que podem chegar a R$ 60 milhões.
Eh, vidão à beira-mar, passeio de lancha, banho de sol na varanda da mansão. Que maravilha é a natureza.
“E o esgoto em uma situação dessa", reclama uma moradora.
“Isso aqui é tudo sujeira, muita sujeira. A gente passa mal”, conta uma senhora.
“Pede o prefeito para vir aqui. Será que ele bebe essa água?”, indaga um homem.
A população de Mangaratiba, no estado do Rio de Janeiro, está revoltada. “A gente vê a saúde precária, a gente vê educação com problemas, o transporte nosso e a água estão precários”, conta um morador.
“Eles aprovam obras, obras aprovadas, mas não feitas. A gente quer que a obra seja concretizada”, diz uma mulher.
Tanta coisa faltando porque, em cerca de 20 meses, R$ 60 milhões foram surrupiados da prefeitura, segundo estimativa do Ministério Público.
É por isso que o repórter secreto do Fantástico está em Mangaratiba, e todo brasileiro decente quer saber: Cadê o dinheiro que tava aqui?
Quando o repórter secreto chega à cidade, encontra protestos. Tem cartaz perguntando ao prefeito Evandro Bertino Jorge, do PSD, conhecido como "Capixaba": cadê os R$ 60 milhões que sumiram da cidade.
E tem adesivo, feito pelos próprios manifestantes, perguntando: cadê o dinheiro que tava aqui? Muita indignação. E muito constrangimento de fazer papel de palhaço no mau sentido.“Eu nunca fiz isso na minha vida, mas eu fui obrigada. Eu não quero morar em um lugar sujo”, conta a professora Marilúcia Gomes.
E a bronca é a seguinte: pela quantidade de sacos de lixo que a prefeitura supostamente comprou, Mangaratiba deveria ser o lugar mais limpo do mundo: 1,8 milhão sacos de lixo. Como na verdade a cidade precisa de 17 mil sacos por mês, essa suposta compra daria para 105 meses. Quase nove anos. Resolveria um problemão para os futuros prefeitos.
Só que não. “Não existiam sacos de lixo”, diz o homem que foi secretário de serviços públicos da prefeitura na gestão que teria feito a tal compra, em 2012. Ele diz que, depois de descobrir que era tudo fraude, foi falar com o prefeito Evandro Capixaba.
“Mostrei a fraude para ele, falei que não existia entrega de sacola, que não poderia ficar assinando notas de recebimento de sacola que não existia. Aí eu passei a ser um funcionário que não servia para ocupar a secretaria”, conta o ex-secretário de serviços públicos Marco Antônio da Silva Santos.
Depois, o então secretário decidiu contar tudo ao Ministério Público. “A partir daí a gente começou a diligenciar, identificar empresas, os seus sócios e como essa fraude ocorreu. Parte do pagamento ficava com os sócios, e o maior montante entregue na mão de representantes de gestores daquele município”, explica o promotor de Justiça do Rio de Janeiro Alexandre Veras.
O repórter Eduardo Faustini foi atrás da empresa responsável pela venda fraudulenta. Achou uma das sócias do negócio.
Fantástico: Como é que você se tornou sócia dessa empresa?
Mulher: Na verdade, eu fui chamada para ser secretária da empresa. Me pediram para emprestar o nome. Como eu era empregada da empresa, não vi problema. Quando eu comecei a me inteirar do assunto da empresa, vi do que se tratava, pedi que retirassem o meu nome.
Mulher: Na verdade, eu fui chamada para ser secretária da empresa. Me pediram para emprestar o nome. Como eu era empregada da empresa, não vi problema. Quando eu comecei a me inteirar do assunto da empresa, vi do que se tratava, pedi que retirassem o meu nome.
Para o Ministério Público, ela não foi usada, a sócia é, sim, parte do esquema. As investigações do Ministério Público levaram a operações de busca e apreensão como uma feita com o apoio da Polícia Federal.
“Nós apreendemos aproximadamente 100 processos licitatórios e a partir daí a gente teve a chance de encontrar ali uma gama de informações que indicam a fraude realizada por esse grupo”, conta o promotor Alexandre Veras.
A quadrilha fraudava várias licitações. Em uma das frentes da falcatrua, um filho e um sobrinho do prefeito, mais o então procurador-geral do município e dois secretários eram sócios de empresas vencedoras das licitações.
“Qualquer porta que se bata, qualquer notificação que se faça, passa, inevitavelmente, por um familiar ou por uma pessoa próxima do prefeito”, diz o promotor Alexandre Veras.
Segundo as investigações, eles conseguiam dar uma aparência de legalidade à negociata forjando editais de licitação em um jornal do Rio, o Jornal "O Povo". A lei exige que o chamado edital de licitação seja publicado em um jornal. O edital é um aviso: os interessados ficam sabendo que a administração pública quer comprar produtos ou contratar serviços. A publicação no jornal é um documento obrigatório, processo da licitação, que é enviado aos órgãos de fiscalização de uso de dinheiro público.
Foi aí que a quadrilha achou que estava dando o pulo do gato. O jornal que estava na banca não era o mesmo que era arquivado no processo.
Ou seja, vamos dizer que um jornal fosse um exemplar do jornal da semana passada. Não tem nenhum aviso de edital de licitação da prefeitura de Mangaratiba. Aí a quadrilha mandava fazer uma página nova, trocava um edital de verdade por um edital de mentirinha, para fingir que a licitação tinha sido comunicada ao público. Assim, ficava tudo certo. A página falsa funcionava como uma prova de que os devidos procedimentos tinham sido seguidos.
Foi aí que a quadrilha achou que estava dando o pulo do gato. O jornal que estava na banca não era o mesmo que era arquivado no processo.
Ou seja, vamos dizer que um jornal fosse um exemplar do jornal da semana passada. Não tem nenhum aviso de edital de licitação da prefeitura de Mangaratiba. Aí a quadrilha mandava fazer uma página nova, trocava um edital de verdade por um edital de mentirinha, para fingir que a licitação tinha sido comunicada ao público. Assim, ficava tudo certo. A página falsa funcionava como uma prova de que os devidos procedimentos tinham sido seguidos.
Por exemplo: a página da edição do dia 21 de junho de 2012 do jornal "O Povo", não tem edital da prefeitura. Mas a mesma edição do mesmo jornal do mesmo dia do mesmo ano, tem.
Agora preste atenção nessa conversa. Foi gravada na sede do Jornal "O Povo" por uma pessoa que denunciou a fraude. É uma testemunha do Ministério Público, e finge que representa o prefeito de Mangaratiba para dar o mesmo golpe. Ele conversa com funcionários do jornal.
Homem: Como é que funciona essa p... do jornal?
Jornal: E com a data que ele quer, isso aí. Ainda mais que é Tribunal de Conta.
Jornal: E com a data que ele quer, isso aí. Ainda mais que é Tribunal de Conta.
O ex-funcionário da gestão do prefeito Evandro Capixaba confirma a denúncia. “Fazia uma publicação com data anterior e montar dentro do jornal para constar na prefeitura. Para apresentar para o Tribunal de Contas, para a promotoria, para quem solicitasse”, conta o ex-subsecretário de Serviços Públicos Iata Anderson.
“O que nós temos naquele município é uma quadrilha trabalhando a fim de se locupletar do dinheiro público. Nós encontramos laranjas, falsidades de documentos públicos, privados, fraudes em licitação, publicações fraudadas em jornal, pagamento de propina, desvio de dinheiro, não-entrega de produtos contratados pelo município. Inúmeras fraudes”, afirma o promotor Alexandre Veras.
Isso, em uma cidade que atrai tanta gente bem de vida para desfrutar das belezas naturais. Infelizmente, também existe outra Mangaratiba.
Isso, em uma cidade que atrai tanta gente bem de vida para desfrutar das belezas naturais. Infelizmente, também existe outra Mangaratiba.
Fantástico: Qual é essa Mangaratiba?
Promotor: É a Mangaratiba pobre, abandonada, sem calçamento, sem saneamento básico. Sem água.
Promotor: É a Mangaratiba pobre, abandonada, sem calçamento, sem saneamento básico. Sem água.
O problema da água atinge a cidade há cerca de um ano, portanto uma situação que antecede a estiagem na região Sudeste. “O esgoto do vizinho, vem de lá e cai na minha porta”, reclama uma moradora.
“Bebo dessa água. Água potável é conectada com água de esgoto. Nós não somos porcos, nós somos gente”, afirma Marilúcia Gomes.
“Essa é a água que nos oferecem, e o governo que tá aí nada faz. Isso aqui é uma pouca vergonha. Olha aí”, conta outro morador.
Até a mulher que o Ministério Público aponta como parte do esquema admite que roubar dinheiro público é maltratar o cidadão. “O dinheiro que eu tiro de uma prefeitura e eu banco uma viagem para Miami, eu estou matando um cidadão”, confessa.
Em nota, a direção do Jornal "O Povo" nega que tenha prestado serviços e recebido dinheiro da prefeitura de Mangaratiba. A nota afirma que o jornal está contribuindo com o Ministério Público para a apuração real dos fatos.
Também em nota, o prefeito Evandro Bertino Jorge, o Evandro Capixaba, repudia as denúncias de que houve falsificação de página de jornal e diz que o dinheiro público é aplicado com responsabilidade em Mangaratiba.
Já o Ministério Público pede na Justiça que o prefeito Capixaba, bem como secretários e ex-secretários e servidores municipais, respondam por improbidade administrativa.
“Cadê o dinheiro que a gente precisa melhorar o nosso município e nada é feito, cadê o dinheiro daqui?”, pergunta um morador.
Nenhum comentário:
Postar um comentário