JORNAL SEM LIMITES DE PÁDUA_RJ: Porciunculense faz arte que vem da alma‏

quinta-feira, 3 de abril de 2014

Porciunculense faz arte que vem da alma‏






Porciunculense produz arte que vem da alma
Por RosimereFerreira


A alegria, a beleza das cores, a liberdade dos traços, a inspiração no cotidiano trouxe às almas sensíveis e iluminadas a arte “naïf”. Tida como a arte “livre de convenções” e “primitiva”, ganhou o mundo, conquistou respeito e espaço no conceituado e exigente mercado das artes.

O termo “Arte naïf” surgiu através do apelido que foi usado para designar tanto a pintura quanto a personalidade de Henri Rousseau em 1890, um pintor autodidata admirado pela vanguarda artística dessa época, que incluía gênios como Picasso, Matisse e Brancusi, entre outros. Rousseau foi o primeiro naïf moderno a ser exposto e valorizado, considerado o pai da arte naïf por Lucien Finkelstein.
No Brasil, um nome de destaque contemporâneo é Ernane Cortat, artista naïf nascido em Santa Clara, terceiro distrito de Porciúncula, que hoje consta entre os maiores nomes do gênero no cenário nacional e internacional. Desconhecido, porém, em sua terra natal, é chegada a hora dos porciunculenses saberem que existe entre seus conterrâneos, um gênio da arte naïf que é o exemplo perfeito da designação do estilo: alegre, agradável, espiritualizado e com uma comunicação que alcança todo tipo de gente, especialmente o mais sensível.
Ernane nasceu em Santa Clara, filho de Geraldo Vieira Cortat e Neréa Ramos Cortat. Neto de Alencar da Fonseca Ramos, o primeiro prefeito do município, e sobrinho do também político Paulo Ramos. Mudou-se para Porciúncula aos 6 anos a fim de estudar. Na cidade ficou até formar-se no curso de Contabilidade, indo, em seguida, dar sequência aos estudos no Rio de Janeiro. Formado em Psicologia Clínica pela Universidade Santa Úrsula, conta que todo o aprendizado acadêmico se juntou às suas lembranças de infância e adolescência para trazer à tona o artista que é hoje: “Acho que o artista começou a existir no Colégio Porciúncula, nas aulas de desenho com Dona Ivone Guimarães, nas de Artes Industriais com a Dona Dilma Mendonça e no Grêmio Recreativo. Mesmo depois de tantos anos, é difícil ver um colégio que incentive assim o esporte e a cultura, o que me ajudou muito, pois era muito tímido, uma timidez exagerada. No colégio existia o Grêmio Recreativo, que era como um programa de TV. Era o máximo de felicidade as apresentações do grêmio, além de ter professores maravilhosos que me facilitaram passar em 4 vestibulares , dois de medicina e dois em Psicologia sem precisar de fazer cursinhos”, conta.

Porciúncula ainda está muito presente na vida do artista, como podemos constatar nesta entrevista exclusiva. Contatos com o autor podem ser feitos pelo e-mail:  ercortat@gmail.com

  •  Quando foi que o artista apareceu em sua vida?
Meu irmão Sylvio Cortat (falecido) era arquiteto, foi morar nos Estados Unidos e virou artista plástico lá, tendo feito um belo trabalho pelo mundo, o que me despertou e comecei a pintar de brincadeira. Nunca levei a sério e nem acreditava no que fazia. De férias no Rio, ele passou aqui, pegou um trabalho sem que eu soubesse e me inscreveu num Salão de Arte da Rede Ferroviária. Ganhei o primeiro lugar, mas não me empolguei. Continuei trabalhando e pintava de brincadeira nas horas vagas. Só não sabia que Sylvio havia levado vários trabalhos meus para os Estados Unidos e apresentado em algumas galerias. Fui convidado para expor e, como tinha muito material, fui para os Estados Unidos com 118 quadros, fiz exposição no Washington World Gallery, depois Miami em três galerias e fui convidado para ir para a Colômbia fazer uma exposição junto com meu irmão numa galeria em Bogotá que era referência no mundo pelo porte da galeria Galeria Marlene Hoffman. As coisas foram acontecendo e vivi em 28 países fazendo exposições, sem programar nada. Tudo aconteceu lá fora durante 8 anos. Depois, resolvi voltar ao Rio, já acreditando que era isto que queria. Tudo surgiu e aconteceu sem nada programado.

  • Você já começou como artista naif? Quais são suas referências?
Sim, comecei como artista naif, pintava sobre fundo preto, diferentemente dos demais, e sempre com pontilhismos e muitos detalhes. Minhas referências foram meu irmão Sylvio Cortat, que muito me incentivou, e Nelson Porto (falecido) artista plástico fantástico que me deixou de lembranças gostar de pintar anjos.

  • A arte naif é um trabalho minucioso, de pontos, cores e alegria. O que esta técnica tem a ver com seu estado de espírito e sua forma de ver a vida e de onde vem sua inspiração?
Minha inspiração começou desde Santa Clara a Porciúncula, com as festas religiosas, principalmente. Meu lado religioso é muito presente, vem do interior, de Porciuncula, das festas de Santo Antonio e São Sebastião, das Folias de Reis, e outros eventos populares. Mas isto chega sem programar muito, espontaneamente. Às vezes penso em fazer o tema X e, quando percebo, o quadro desviou para algo totalmente diferente. Agora, depois de ter participado de um fantástico livro TROPICALIA - Panis et circences - que adorei ter feito e estar participando de outro a sair sobre Tom Zé, percebo umas mudanças lentas acontecendo. No momento, ando gostando de fazer quadro homenageando pessoas que admiro, tipo Frida Kahlo e agora Fernando Pessoa. Fiz um e, em andamento Mario Quintana. Quanto ao estado de espírito, a arte naif me traz alegrias; gosto desta coisa de muitas cores, detalhes e a liberdade que ela dá - se quiser fazer um elefante vermelho posso, sem me preocupar se é a cor real deles, por exemplo, e eu vou além. Hoje uso materiais antes não usado e criticado por alguns. Não se pode deixar de existir a liberdade e não quero me sentir preso a escolas. Sigo meu caminho da forma que acho legal. Faz a vida ficar mais leve.

  • Por falar nisto, que lembranças você tem de Porciúncula?
Tenho as melhores lembranças de Porciúncula, dos banhos de açude na fazenda do dr. Edésio, por exemplo. Tive uma infância e adolescência numa casa que parecia uma chácara em frente à casa do Sr. Jose Lannes com um quintal imenso que permitiu a mim e meus irmãos viverem toda uma infância livre, subir em árvores, andar a cavalo, enfim, coisas que num grande centro não existia. E tenho duas lembranças muito fortes que me acompanham até hoje: lembro muito do cinema – acho que ali começou todo meu amor à arte -, e do Colégio Porciúncula. Só tenho aplausos para o ensino no Colégio que fez e faz parte da minha história.

  • A arte naif tem o mesmo valor de mercado dos estilos mais clássicos?
Esta coisa de valores é muito relativa, não vejo tanta diferença assim, todas as artes são irmãs, depende do que se faz, da forma que coloca seu trabalho no mercado.  Agora mesmo, estou partindo para uma coisa que sempre quis fazerestamparia. Fui convidado, já usam minhas imagens para mais de 50 objetos, mas estamparia era uma coisa que queria. Estou ainda em fase de experimentação, talvez seja mais a longo prazo, mas o que fiz deu um resultado legal. Quanto a diferença de estilos, sigo o pensamento dos críticos: os acadêmicos pintam com o cérebro, os naifs, considerados ingênuos, pintam com a alma. Coloco alma em minha arte e este é o valor que me importa.


  • Como tem sido o reconhecimento do seu trabalho?
Ganhei muitos prêmios, mas o que mais me emocionou foi o Troféu Galaxie de Cultura, patrocinado pelo MASP (Museu de Arte de São Paulo) e o jornal Folha de São Paulo. A partir daí, as coisas começaram a acontecer de forma melhor aqui no Brasil. Participei de 14 trabalhos para a UNICEF, ilustrando cartões de Natal com meus quadros. Quanto a reconhecimento, ele vem. Tenho medo que seja rápido, pois, às vezes ele vai embora na mesma rapidez. O que acho bom é estar sempre sendo lembrado, recebendo retornos. Estou feliz como estou. Minha arte é comercializada no Rio de Janeiro, São Paulo, Brasília, agora em Recife e Nova York, Tel Aviv, Portugal e França, onde tenho galerias que trabalham comigo.

  • O que significa a arte em sua vida?
A arte é o meu ofício, o meu prazer, minha fonte de viver.




















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