Um mês após assumir a Secretaria estadual de Fazenda, o contador Gustavo Barbosa se acomodou na cadeira da sala de reuniões para anunciar que cumprirá a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) — concedida por meio de uma liminar proferida pelo presidente da Corte, Ricardo Lewandowski — de que o pagamento dos salários dos servidores estaduais seja feito até o 3º dia útil do mês seguinte ao trabalhado (em vez do 10º).
Mas revelou desconforto ao admitir que, hoje, ainda não há dinheiro em caixa para isso. Barbosa confirmou que o socorro federal de R$ 2,9 bilhões — dinheiro liberado para a Olimpíada — vai durar apenas quatro meses, ou seja, até a folha de outubro, paga em novembro. Depois disso, ele diz não saber como ficarão os pagamentos do funcionalismo. Para ele, é necessário aumentar a idade mínima de aposentadoria, já que a maioria dos servidores pertence à classe média, que tende a viver mais.
Qual é a real situação das contas do estado?
Com a minha chegada, infelizmente, não veio mais dinheiro. Temos acumulado perdas de arrecadação desde 2015. A receita vem declinando, apesar do aumento das alíquotas de imposto aprovadas na Alerj (Assembleia Legislativa).
É possível estimar?
Infelizmente, no mês de julho, houve uma frustração de receita de 10%, de pouco mais de R$ 300 milhões. Se, por um lado, você tem uma receita que declina, por outro a despesa é quase incomprimível. Obviamente, aqueles R$ 2,9 bilhões (dinheiro da União para socorro às finanças do Estado do Rio) desoneraram a atividade da Segurança Pública (permitindo usar o dinheiro em caixa para outros fins).
Há dinheiro hoje em caixa para pagar os servidores?
Não. Todo dia pinga. Hoje, não temos dinheiro, mas a expectativa é que consigamos arrecadar o suficiente. Agora, se vamos parcelar (os salários) ou não... Não posso falar que sim nem que não.
O que o funcionalismo pode esperar até o fim do ano?
Há uma determinação do Supremo Tribunal Federal, e vamos sempre procurar respeitar o que este determina.
E a folha de agosto, que será paga agora em setembro?
Vamos buscar cumprir a determinação do ministro (Ricardo) Lewandowski.
E o 13º salário? O governo vai parcelar novamente o abono?
Não posso adiantar nada sobre isso, porque estamos buscando alternativas.
Como é a negociação para liberar recursos para as secretarias?
Todos falam que estou numa posição muito ruim. Eu acho que quem está numa posição ruim é o secretário de ponta. É o Luizinho (Luiz Antônio de Souza Teixeira Júnior, secretário de Saúde), o Beltrame (José Mariano Beltrame, secretário de Segurança Pública) e o Wagner Victer (secretário de Educação). Quem enfrenta um hospital é o Luizinho. O secretário Beltrame diz: “Poxa, você não pagou o salário do soldado”. Eu tenho que ouvi-lo, ainda que seja para falar que não temos dinheiro.
Há alternativas para elevar a arrecadação estadual?
A venda da folha de pagamento dos servidores (para um banco) está programada para o ano que vem. Este ano, já finalizamos o processo (ao estender o contrato firmado com o Bradesco, por R$ 250 milhões já pagos pela instituição financeira). Também há a venda de ativos imobiliários. O Estado colocou os ativos no Rioprevidência. Vendemos 23 imóveis, arrecadando quase R$ 20 milhões. São R$ 20 milhões a menos que se exigirá de caixa para pagar aposentadorias e pensões. Outra alternativa é a securitização da Dívida Ativa (venda dos débitos que o governo tem a receber por um valor mais baixo, para instituições interessadas em assumir a cobrança dos devedores).
Há data para que isso seja feito?
Dependemos do Congresso. Hoje, somente poderiam ser objeto de securitização dívidas que forem parceladas. E as não parceladas? Para um orçamento de R$ 50 bilhões, você tem um custeio de R$ 4,5 bilhões por ano. Estamos fazendo reduções. Quanto ao servidor ativo, ao inativo e ao pensionista, não se pode fazer nada. Os comissionados representam uma despesa de R$ 400 milhões por ano, de uma folha de R$ 41 bilhões, ou seja, equivalente a 1%. A outra despesa é a dívida do Estado do Rio com a União e com os outros credores, em torno de R$ 9,5 bilhões.
Sobre a venda da folha, qual é a expectativa de receita?
Eu prefiro não dar um valor. A portabilidade (possibilidade de o servidor transferir o salário de um banco para o outro) trouxe um redução de valor de ativo. Da primeira vez que se negociou a folha, a venda foi fechada pelo valor maior. A nova transação será feita no meio do ano que vem.
Há prioridades de pagamento?
Há para o servidor. Tentamos administrar os poucos recursos, dentro de pastas essenciais, que são as de Saúde e Segurança. O Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação) tem pago parte dos salários da Educação, mas o custeio é nosso. São áreas sensíveis, que recebem o maior volume de recursos. Pode parecer que não, mas o servidor público, desde o ano passado, tem sido priorizado. Temos fornecedores que estão sem receber há meses.
Quanto foi aplicado da ajuda federal de R$ 2,9 bilhões?
Tem uma destinação específica que é a Segurança, inclusive a folha (de policiais civis e militares, além de agentes penitenciários). Isso propiciou ter uma estabilidade para o pagamento dos (demais) servidores, porque estamos conseguindo liberar recursos.
Esse dinheiro dura até quando?
Podemos dizer que em torno de quatro meses, desde que chegou, em julho.
E depois desses quatro meses?
Buscamos trabalhar com a redução de despesas e o aumento de receitas. É difícil dizer, neste momento, como será atender à demanda do ministro do Supremo daqui a quatro meses.
Tivemos o episódio de o governo escolher quem pagaria primeiro, depositando os salários dos ativos e deixando de lado os inativos. O modelo vai se repetir?
Aquela decisão foi de governo. Não posso dizer se vai repetir. Houve muitas críticas da população. Quando se decide, não se tem o objetivo de fazer maldade. É a completa escassez de recursos. Eu sei que não foi algo que deixou todo mundo satisfeito. Vamos buscar ser o menos danoso para o servidor. Se erramos ou não, enfim, é difícil dizer agora.
E o parcelamento dos salários?
Não dá para falar que vai ou que não vai acontecer.
Há lista de credores a priorizar?
Não, o que se prioriza é a pasta. A pasta de origem é que determina a prioridade. Você tem R$ 100 e manda R$ 30 para a pasta. Ela vai ter capacidade de decidir como serão usados.
E a proposta de reforma da Previdência para o funcionalismo?
Sou favorável. O governo fez uma reestruturação em seu sistema com a auditoria de benefícios e a redução de mais de R$ 1 bilhão, nos últimos três anos. No Estado do Rio, a pessoa se aposenta, em média, aos 56 anos. O servidor é classe média. Essa classe média vai viver mais 25 anos com benefício previdenciário.
O que acha da idade de 65 anos?
Acho bastante razoável. O Brasil, hoje, para a classe média, tem uma perspectiva de vida muito parecida com as de países de primeiro mundo. Lá fora, a grande maioria já está em 65 anos, alguns em 67 anos.
E o duodécimo? Será reduzido?
Há uma redução de valor (repassado mensalmente) para cada Poder, porque é vinculado ao valor orçado para todo o Estado. Não é objetivo, mas consequência.
Qual é o valor?
Nós mandamos uma previsão de orçamento com déficit de R$ 17 bilhões. Não se resolve déficit de um ano para o outro.
A revisão dos royalties sai este ano ainda?
Isso está sendo discutido com a ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis).
De quanto?
Cerca de R$ 1 bilhão por ano.
Fonte: Jornal Extra