A 15 dias das eleições presidenciais norte-americanas, Brasil e Estados Unidos fecharam um pacote comercial com medidas para facilitar o comércio entre os países, desburocratizar a regulação e reduzir a corrupção. O entendimento, antecipado pelo Estadão/Broadcast na semana passada, foi bem recebido pelo setor privado e é considerado pelos dois governos o primeiro passo para um futuro acordo de livre-comércio.
“É um sinal muito positivo para um acordo mais amplo entre EUA e Brasil e que, em última instância, pode levar a acordo de livre-comércio entre os dois países. Queremos fazer isso passo a passo, ter certeza de que o acordo é ótimo para o Brasil e ótimo para os estados unidos”, disse nesta segunda-feira o conselheiro de Segurança dos Estados Unidos, Robert O’Brien, após encontro na Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp).
O Acordo de Comércio e Cooperação Econômica vinha sendo negociado pelos dois países desde 2011, mas estava em hibernação até a eleição do presidente Jair Bolsonaro. O alinhamento do presidente com o colega norte-americano Donald Trump reaqueceu o processo, que foi acelerado nos últimos meses na medida em que Trump caía nas pesquisas de intenção de voto para reeleição.
Em março do ano passado, após um encontro nos Estados Unidos, os dois presidentes anunciaram a retomada das negociações. As conversas técnicas começaram apenas em agosto do ano passado e a cooperação e rapidez do trabalho dos brasileiros para chegar a um entendimento impressionou negociadores norte-americanos.
Apesar de os brasileiros almejarem o livre-comércio, pelas regras do Mercosul, isso só poderá ser feito em acordo com todos os países do bloco. Por isso, o pacote comercial anunciado nesta segunda-feira foca em questões não-tarifárias, que podem ser negociadas bilateralmente, sem a anuência dos outros integrantes do bloco sul-americano.
O anúncio faz parte da visita da delegação norte-americana ao Brasil, liderada por O’Brien com autoridades do Escritório do Representante de Comércio (UTSR), da Agência de Crédito a Exportação do governo dos Estados Unidos (Eximbank) e da Corporação Financeira dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (DFC, na sigla inglês).
O banco de desenvolvimento anunciou nesta segunda-feira, 19, o aporte de US$ 984 milhões em investimentos e projetos brasileiros. A maior parte dos recursos será utilizada pelos bancos Itaú e BTG Pactual para empréstimos a pequenas e médias empresas atingidas pela pandemia do coronavírus.
“A primeira etapa do acordo traz temas que implicam em um benefício efetivo. Ao reduzir prazos e obrigações, você reduz os custos sem criar polêmica. Não depende desse governo ou do outro”, afirmou a presidente da Câmara Americana de Comércio (Amcham), Debora Vieitas.
Para a Confederação Nacional da Indústria (CNI), o acordo é “pedra fundamental” nas negociações para o livre-comércio. “Há grande expectativa no setor privado para iniciarmos as negociações dos acordos de livre-comércio e para evitar a dupla tributação”, completa o diretor de Desenvolvimento Industrial da CNI, Carlos Eduardo Abijaodi.
Pacote
O principal acordo é o de facilitação do comércio, que pretende reduzir burocracias administrativas e aduaneiras na exportação e importação de bens e diminuir prazo e custos das operações. Uma das medidas é o compromisso dos dois países em reconhecer programas de Operador Econômico Autorizado (OEA), que são empresas importadoras e exportadoras com uma espécie de selo do governo. Com esse "carimbo", elas conseguem desembaraçar suas mercadorias de maneira quase automática nas fronteiras. Esse reconhecimento não será imediato e ainda depende de uma visita de autoridades dos EUA às aduanas brasileiras, que foi adiada por conta da pandemia.
O entendimento prevê ainda o uso de tecnologias no processamento das exportações e importações, como adoção de documentos eletrônicos para todas as declarações e formulários exigidos na aduana, com poucas exceções.
Já o acordo de boas práticas regulatórias traz um protocolo para a adoção de compromissos como revisão de regulações existentes e a previsão de um órgão ou mecanismo central de coordenação para supervisionar a adoção de boas práticas regulatórias pelo governo federal. É o primeiro acordo com cláusulas vinculantes adotado pelo Brasil nesse tema e prevê que, em 60 dias, seja feita uma proposta com impacto “significativo” no comércio para garantir a retirada de obstáculos regulatórios desnecessários.
Outro anexo prevê medidas anticorrupção, um dos primeiros sobre o tema negociado em acordos comerciais. O documento determina a adoção de padrões que proíbam um funcionário público de solicitar ou aceitar suborno ou auxiliar ou encorajar tais crimes. Também deverão ser adotadas medidas para proteger quem reportar práticas de corrupção a autoridades.