Na semana dos dias 14 a 18 de maio a Casa da Cultura e Museu de Aperibé promoveu uma visita diferente para pessoas de Aperibé e municípios vizinhos na apresentação do local no projeto ‘Luz e Sombra’. Com as luzes apagadas o público teve a oportunidade de deparar com o local de outra forma e poder prestar a atenção mais aos detalhes. Este ano em comemoração a Décima Semana Nacional dos Museus o tema para discussão e apresentações de novas propostas para a interação comunidade/museu foi “Museus em um mundo em transformação.” Desta forma, novos desafios, novas inspirações coloca as instituições para assumirem o papel ainda mais estratégico e desafiador.
O agendamento para esta atividade ocorreu uma semana antes, abrindo-se para municípios vizinhos. Devidamente agendados, grupos de até quinze pessoas eram guiados pelo museu por personagem da própria história. Trata-se de pessoas simples, sem nenhum curso de teatro, mas que desempenharam os papéis de forma brilhante.
Os grupos entravam por uma sala principal, onde acontece uma exposição de esculturas. Em meio a elas, estátuas vivas ganhavam movimento à medida que diferentes sons eram executados, à média luz, animados por raios de luz néon e névoa artificial. Este espaço comunicou ao público a época, contemporânea pelas cores e sons, mas não deixou de remeter ao passado a partir dos personagens em ação. Uma gravação explicava todo o processo executado.
Um pouco mais adiante, em total silêncio, um corredor arrumado em arte sacra do município levava o público a uma comunicação com os primeiros colonizadores, que trouxeram, além de muitas ferramentas para trabalhar e progredir, a sua fé através do catolicismo, representados pelos oratórios de família com os santos de devoção, algumas imagens do século XVIII, XIX e XX. Tendo como fundos musicais toques de sinos e cantos gregorianos, uma oração dos primeiros colonizadores explicava aos visitantes os medos, as angústias e as saudades da terra natal, num ambiente de névoa artificial.
Outro ambiente, representado por uma barbearia, levava os visitantes a uma dimensão entre os espaços sociais de ontem e o de hoje. As barbearias foram, no passado, lugares de encontros sociais. Não era à toa que muitos homens frequentavam estes ambientes quase que diariamente. As barbearias, assim como as confeitarias nos grandes centros, bares e padarias eram locais de comprar, vender, falar de política, economia, religião e da vida alheia. Ao fundo era executada canções que levavam às épocas da boemia, com Noel Rosa, Nelson Gonçalves entre outros. Os visitantes eram levados a um diálogo com o guia da visitação, devidamente vestido à moda do tema.
Depois deste encontro com a boemia, os visitantes eram convidados a voltarem um pouco no tempo - o período da escravidão. Numa sala escura tendo somente luz sobre uma escritura de compra e venda de uma escrava de nome Mariana, de 29 anos, negócio feito no cartório de Cabo Frio para trabalhar na Fazenda Santo Antônio, de propriedade de Francisco Felipe Boechat, datada do ano de 1876. Enquanto uma gravação narra o que diz a escritura, principalmente sobre as características da cativa, um personagem simbolizando a “senhora de fazenda e de escravos”, toca uma sineta e entram duas escravas, devidamente vestidas e servem um cafezinho adoçado com rapadura e biscoitinhos de banana d’água, receita de São Tomé e Príncipe na África. Ainda neste espaço, ao término da apresentação da escritura, um barulho de trabalho no pilão chama a atenção dos visitantes, que são atraídos para a cozinha iluminada à luz de candeeiros e lamparinas a querosene, onde um personagem faz o papel de um escravo doméstico, pilando café.
No quarto, uma viúva vestida de preto e com véu na cabeça recebe a carta de um sobrinho criado por ela, mas que saiu de Aperibé para trabalhar em Campos. Lá ele é recrutado para a Primeira Guerra Mundial e na carta descreve para a tia toda angústia e sentimento que nutre naquele momento, ora de raiva dos alemães que os culpa pela guerra, ora de tristeza pela incerteza se um dia irá voltar. O ambiente é composto ainda por um lampião a querosene aceso à media luz, dois personagens estátuas vivas trajando roupas daqueles tempos e a carta original sobre uma mesinha, enquanto a tia chora.
Na sala de visitas da casa, um casal de idosos é servido pela escrava, sendo este, importante acervo doado pelo artista plástico itaocarense Henrique Resende que compõe o espaço permanente do museu. O casal recebe apenas iluminação apenas no rosto. O espaço têm muitos relógios de pêndulo, todos do século XIX, a narração fala sobre a passagem do tempo, função dos relógios e que em cada um é marcada pelas rugas no rosto.
Para fechar o passeio, na última sala, é narrada a história do grupo da morte ou coluna da salvação, como eram conhecidos nos finais do século XIX e que durou até a década de 1940. A narração tem como fundo, músicas que incitam ao suspense. Não menos importante, a pouca luz incide sobre a coleção de sucatas de armas daquele grupo, acendendo e apagando, aumentando ainda mais a curiosidade.
Segundo Diretor do Departamento de Cultura de Aperibé e Presidente da Casa da Cultura e Museu de Aperibé, Marcelo da Cunha Hungria, neste espaço ocorreu uma breve recapitulação sobre o projeto. “Os visitantes são levados a entender que, nem sempre olhamos para o acervo de um museu e o vemos. Olhar simplesmente não é “ver”, de fato. A história é feita também de acontecimentos ruins, mas precisam ser contados para serem entendidos e que não mais se repitam. Também ocorre a discussão sobre a ideia pejorativa que alguns ainda têm sobre o interior, quando é considerado pacato. Nossa gente do passado viveu importantes acontecimentos, eletrizantes ao ponto de podermos riscar a fama de lugarzinho no meio do nada e pacato,” destacou.
Na quinta-feira da semana de museus, dia 17 de maio, também foi feita uma apresentação especial para os convidados que participaram de uma mesa redonda para discussão sobre o tema proposto pelo IBRAM. Pessoas ligadas à cultura, educação e política local foram convidadas para participarem deste bate-papo regado de um café à moda antiga. O grupo opinou sobre a proposta e sugeriu que a ideia não se acabe. Apresentação como esta seja organizada por temporadas com diferentes temas de abordagens e, além disso, que se faça um livreto contando a experiência de grande criatividade e crescimento para a instituição.
Ainda de acordo com Marcelo a ousadia de se fazer um espetáculo inserindo o visitante na própria história. “Certamente isso o ajuda a compreender que a história é algo permanente, não acaba em si e que todos nós fazemos parte dela,” concluiu.
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