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quarta-feira, 16 de outubro de 2013

Planos de saúde individuais: produto quase em extinção · Operadoras optam por coletivos, não regulados. Governo rediscute modelo




Quem pretende contratar um plano de saúde precisa ter atenção. A oferta de planos individuais ou familiares — regulados pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), com reajustes limitados e regras rígidas sobre rescisão contratual — é cada vez mais limitada. No Rio de Janeiro, corretores oferecem apenas Unimed-Rio. De outras operadoras, são vendidos apenas planos coletivos — empresariais ou por adesão. Neste, são incluídos quem busca um plano individual. E o que inicialmente pode parecer vantajoso, devido a mensalidades mais baixas, esconde armadilhas, como reajustes altos, ruptura unilateral de contrato e possibilidade de rejeição de idosos ou pessoas com doenças preexistentes. Esse cenário preocupa especialistas. Por isso, em 21 de novembro, a Secretaria Nacional de Defesa do Consumidor (Senacon), do Ministério da Justiça, se reunirá com membros do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor para tratar deste tema.
Para verificar como essas ofertas são feitas, O GLOBO consultou quatro corretoras e esteve na loja de uma operadora. No escritório da Amil, no BarraShopping, uma atendente afirmou que a empresa não vende planos individuais. Em seguida, disse que há apenas o Medial 115 — “que não é um bom negócio” por oferecer “rede básica da básica”, coparticipação e mensalidade alta. Depois, entregou um cartão da One Health — que, segundo a Amil é um braço de seu grupo destinado ao segmento premium, mas que foi apresentada pela atendente como uma corretora. Na conversa, ela ressaltou que o plano coletivo é mais barato e esclareceu que não oferecer os individuais é um direito da empresa.
As operadoras não são obrigadas por lei a vender planos individuais ou familiares. Sérgio Guerra, coordenador do mestrado em Direito da Regulação da Fundação Getulio Vargas, no Rio, explica que a saúde é um serviço econômico de interesse geral e que, por isso, tem um marco regulatório:
— Se não houver regulação que obrigue o empresário a fazer o que não é tão lucrativo, ele não faz. No caso dos planos de saúde, eles fugiram para o lucro do coletivo por não ser regulado. Hoje, a ANS não pode obrigar a venda de planos individuais.
Para Selma do Amaral, diretora de Atendimento do Procon-SP, o que se vê hoje é resultado de brechas:
— O consumidor precisa ter escolha. A ANS tem de trabalhar em favor dos principais interessados, os consumidores. Ou ela estimula os planos individuais ou regula os coletivos. A lei foi criada para proteger o mais vulnerável, que hoje está no de adesão, em especial nos de menos vidas.
Estima-se que 85% dos planos coletivos tenham menos de 30 vidas. Ou seja, são pequenos grupos sem poder de negociação. Aumentos em grandes proporções são abusivos e não autorizados pelo Código de Defesa do Consumidor (CDC). Para lidar com isso, a ANS publicou uma norma (309/2012) que, desde maio, obriga as operadoras a agrupar os contratos de até 30 vidas e calcular um percentual único de aumento, diluindo custos.
Mas não é só o aumento excessivo da mensalidade, que pode chegar a 500% ao ano, que põe o consumidor de adesão em risco. Esses planos também impõem regras ilegais para a aceitação de novos clientes. O programador de computadores Roberto Bruder, de 40 anos, foi cliente da Amil por sete anos num plano vinculado à empresa onde trabalha e que, em julho, decidiu não renovar o contrato. Ele e outros colegas decidiram contratar a Amil para um novo plano, incluindo seus dependentes. Obeso, com 140 kg, ele foi o único a não ser aceito.
— Temia que houvesse algum problema, já que estou bem acima do peso ideal. Então, não vinculei meu contrato ao das minhas filhas, de 3 e 9 anos. Fiz o contato com o corretor em agosto. Uma semana depois, ele me ligou dizendo que as meninas foram aceitas, mas eu não. E não disse o motivo — diz.
O GLOBO perguntou à Amil o motivo da recusa. No dia seguinte, o contrato de Bruder foi aceito. Segundo a Amil, o problema ocorreu porque a documentação apresentada pelo corretor estava incompleta, o que é negado pelo programador.
Fatos como esse são comuns em planos não individuais. Um dos corretores consultados pelo GLOBO disse que todo mês ao menos um contrato é negado por doença preexistente, necessidade de tratamento constante ou idade. Essas negativas, porém, são proibidas pela Constituição, pelo CDC e pela ANS. Sempre que ocorrerem, devem ser denunciadas à reguladora, que pode aplicar multa de até R$ 50 mil.
Terceirização do risco
Joana Cruz, advogada do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), destaca que a rejeição a crianças, que também é comum, é ilegal.
— A criança não tem personalidade jurídica. Pode ser exigido que seja dependente de um responsável, mas não pode ser recusada.
Presidente da Associação Nacional do Ministério Público do Consumidor, Murilo Morais, que estará na reunião de novembro com a Senacon, afirma que a redução da oferta de planos individuais é um tema que preocupa, pois há uma terceirização do risco, com a aplicação de reajustes altos. E já há ações do MP em alguns estados sobre esse tema:
— Quando se pensou no coletivo, pensava-se em algo realmente grande, capaz de, via mercado, garantir preços. Hoje, o que ocorre é uma simulação de grupos para a venda de planos coletivos.
A advogada Renata Vilhena diz que são criadas figuras jurídicas só para permitir a adesão a um plano, o que, diz a ANS, é ilegal. Ela diz que no contrato há informação sobre o tipo de plano, mas reconhece que as pessoas são levadas a crer que estão optando por um individual. Um dos corretores se negou a entregar o contrato antes de fechar negócio.
A Federação Nacional de Saúde Suplementar e a Associação Brasileira de Medicina de Grupo dizem que a oferta de planos por segmentação (individual, empresarial ou por adesão) é livre à iniciativa privada. A Amil disse vender planos individuais, mas que, desde 13 de setembro, passaram a ser produtos regionais em cinco capitais.


MATERIA O GLOBO

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