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domingo, 17 de janeiro de 2016

Plantio coletivo de cana forrageira garante mudas e alimentação do gado no Norte Fluminense


Parceria entre Cogem e entidades públicas traz novo fôlego aos produtores de leite que tiveram prejuízos com a seca

Dois mil e dezesseis começa trazendo um novo ânimo para os produtores da microbacia São Joaquim, em Cardoso Moreira, no Norte Fluminense. A paisagem mais verde que a dos últimos três anos espalhou um clima de confiança entre os produtores de leite. Com a volta do período de chuvas, a tendência é ter mais alimento para o gado e, consequentemente, o aumento da produtividade leiteira. Além da ajuda da natureza, os produtores também contribuíram para essa mudança de perspectiva no campo. Foi por meio do protagonismo social, incentivado pelo Programa Rio Rural, que eles expandiram o cultivo da cana forrageira (utilizada para alimentação animal) no município. Atualmente, mais de 40 produtores de leite deixaram para trás as lembranças da temporada de verão com seca e pouca ou nenhuma alimentação para o gado.

A cana-de-açúcar não é apenas símbolo histórico das grandes usinas do Norte Fluminense. Depois do capim, é a principal fonte de alimentação do gado leiteiro, pois a planta é adequada às condições de clima e solo e produz grande quantidade de forragem para os bovinos.“Quando as usinas fecharam as portas nas décadas de 1980 e 1990, essa região, que era cultivada com cana, foi ficando com uma área de plantio cada vez menor. Mesmo assim, deu para alimentar o gado. Mas, com a seca ficando pior a cada ano, o vegetal não crescia e os produtores passaram a comprar cana de outros municípios. Resultado: ficaram sem dinheiro para investir nas mudas de cana”, explica Antônio Carlos Borges, supervisor do escritório local da Emater-Rio.
Diferente de outras culturas, a muda de cana, também conhecida como “cana-planta” demora quase um ano para ficar pronta. É o primeiro corte do caule de onde se extrai a sacarose – que, na indústria, vai dar origem ao açúcar. O caule é dividido em segmentos iguais, como se fossem “nós”. Debaixo da terra, cada nó vai virar um novo pé de cana-de-açúcar.

Comitê Gestor de Microbacia: a mudança de rumo a partir da organização social

Sem cana para oferecer aos animais, os produtores que fazem parte do Cogem da microbacia São Joaquim tiveram uma ideia durante uma reunião: replantar as lavouras de cana forrageira (usada exclusivamente para alimentação do gado) para que houvesse uma pequena quantidade de mudas a ser distribuída na região e assim expandir novamente a oferta de alimento no pasto. A partir daí, várias entidades se uniram para colaborar na criação de um banco de sementes. A prefeitura financiou a preparação do solo, a Emater-Rio deu assistência técnica e a Pesagro-Rio elaborou um projeto com recursos da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj).“Antes não tínhamos muda de qualidade e, com esse projeto, foi possível desenvolver isso. Além da muda, fornecemos a tecnologia de produção e adubação orgânica”, explica Arivaldo Viana, pesquisador e coordenador do projeto de cana e produção de derivados da cana, da Pesagro-Rio.

Com as mudas em mãos, o Cogem procurou uma área de quase dois hectares com um bom solo para fazer o plantio de 17 toneladas de cana-planta. O proprietário do terreno cedeu o espaço e assim foi fechado o acordo: metade da lavoura pertence ao dono da área e a outra metade é repartida entre os produtores da microbacia.

A partir daí, os agricultores fizeram a divisão de tarefas para o plantio coletivo da cana.“Vinha um pessoal e fazia o sulcamento; outros faziam o plantio. Tinha também o grupo da manutenção e cercamento da área, para que tudo ficasse bem cuidado. Para quem quer reformar canavial ou fazer um novo, essa é a hora, pois temos a cana para ser o pontapé inicial”, enfatizou o produtor Felipe Azevedo.

Depois de um ano, a cana-planta atingiu o ponto ideal de corte e mais de 20 produtores já fizeram cadastro para retirar as mudas a partir de março, que é o mês habitual de cultivo. “Hoje, na propriedade, eu só tenho cana para alimentar os animais, sem nada de muda. Estou satisfeito, porque antes eu era obrigado a comprar fora. Era caro. Um caminhão de quatro toneladas de cana custava R$ 1 mil. Inviável para a gente”, desabafou o produtor Eduardo Queiroz.

A ideia de ter o próprio banco de sementes foi o que incentivou o produtor José Hélio Zanela a fazer parte dessa experiência do plantio coletivo de cana. Ele conseguiu antecipar a época de cultivo e, há três semanas, recebeu as mudas, que já começaram a brotar no espaço de um hectare. “Nessa seca até o vizinho me cedeu um pouco de cana. Aqui não faltou por muito pouco. Eu fiquei preocupado. Por isso estou me preparando agora para que nos próximos anos não passe sufoco. E se alguém precisar de muda, no fim do ano até eu já consigo ajudar”, frisou Zanela.

O supervisor da Emater-Rio, Antônio Carlos Borges, enfatiza que o projeto é promissor em municípios que enfrentam escassez de mudas de cana, mas que é igualmente importante pelo efeito social que provoca. “O Rio Rural trouxe essa agregação das pessoas em prol de uma mesma causa. A mão de obra é difícil no campo e é importante quando você trabalha com essa organização toda; esse mutirão, essa compreensão de que é preciso que todos se ajudem para todos saírem ganhando”, disse ele.

Melhores mudas para o gado
A cana usada no plantio coletivo é da variedade RB 867515, que tem uma boa digestibilidade para os animais. “Ela tem menos folha e mais cana. É uma ótima fonte de energia para bovinos por causa da quantidade de açúcar. De modo geral, ela ajuda o gado a produzir mais leite e a manter o mesmo nível de produção do verão durante o inverno, o que não é fácil”, completou o pesquisador da Pesagro-Rio.

Cardoso Moreira é o segundo município do Norte do estado a receber o plantio coletivo de cana, pois São Fidélis também emprega esse sistema. No Noroeste, os produtores de Bom Jesus do Itabapoana e Miracema já vivem essa experiência. “A nossa ideia é expandir a cana forrageira nas duas regiões”, arrematou Arivaldo Viana.


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