A chamada “Lei de Responsabilidade Fiscal” (LRF) aprovada em 2000 (Lei Complementar 101) tem origem em imposições do Fundo Monetário Internacional (FMI) ao Brasil, atentatórias à soberania nacional.
De acordo com árdua luta do saudoso Deputado Federal Sérgio Miranda, a LRF foi uma grande “farsa para privilegiar o pagamento de juros da dívida em detrimento dos gastos sociais”, esclarecendo que “a real face dessa medida é perpetuar em lei a política do atual governo de controle sobre as despesas sociais e o constrangimento de estados e municípios”.
É evidente que todos concordam com responsabilidade fiscal, mas é preciso estar atento ao que efetivamente está por trás dessa Lei, que, segundo Sérgio Miranda “sua motivação não é o combate à corrupção nem a defesa da moralidade pública; não se busca a eficácia e a eficiência dos gastos públicos, mas sim o sumário cumprimento das metas fiscais para pagar encargos da dívida por meio da obtenção de superávits. Para tanto, o governo incorre em uma política absurda e inédita na história de nosso País: governadores e prefeitos que simplesmente não se sujeitarem ao modelo de severas restrições e gastos com pessoal e com despesas sociais serão enquadrados no Código Penal e acusados e criminalizados como irresponsáveis fiscais. A lamentável novidade é a criminalização da gestão pública.”
Ao mesmo tempo em que estabelece esse rigoroso controle sobre o gasto social, a mesma Lei deixa livre o gasto do Banco Central com a política monetária, sem qualquer limite, e ainda estabelece que tal prejuízo será transferido para o Tesouro Nacional, isto é, para toda a sociedade. Em 2009, o prejuízo do BC foi de R$ 147 bilhões; em 2010, R$ 50 bilhões. E quando o BC aufere algum lucro, este não vai para o Tesouro, mas sim para pagar a dívida. É impressionante o privilégio da questionável dívida pública, que nunca foi auditada, como manda a Constituição Federal.
Conforme constou da Carta de Intenções ao Fundo Monetário Internacional (“Memorando de Política Econômica”) de 13/11/19983, o governo de Fernando Henrique Cardoso prometeu ao Fundo a aprovação da LRF:
1 Coordenadora Nacional da Auditoria Cidadã da Dívida (www.auditoriacidada.org.br )
2 Economista, voluntário da Auditoria Cidadã da Dívida
15. O governo federal planeja realizar mudanças fundamentais no gerenciamento das suas finanças. Um elemento chave em tais esforços será a nova Lei de Responsabilidade Fiscal que o governo enviará ao Congresso até dezembro. A nova lei estabelecerá um arcabouço geral para orientar o planejamento orçamentário e sua execução. Com vistas a garantir a solvência fiscal, a lei estabelecerá entre outros critérios de prudência para o endividamento público; proporcionará estritas regras para o controle dos gastos públicos; estabelecerá regras permanentes para limitar os déficits orçamentários, bem como proibirá quaisquer novos refinanciamentos pelo governo federal da dívida estadual e municipal. Além desses preceitos, a lei incluirá mecanismos disciplinares para o caso de inobservância das suas metas e procedimentos.
Na Carta de Intenções (“Memorando de Política Econômica”) de 28/11/20004, o governo ressaltou os “progressos adicionais consideráveis na reforma estrutural da área fiscal”, onde incluiu a Lei de Responsabilidade Fiscal como um instrumento para a consecução dos objetivos e metas estabelecidos:
“(...) Como um importante passo em direção à sustentabilidade fiscal, a Lei de Responsabilidade Fiscal foi promulgada no início de maio, após ter sido aprovada pelo Congresso Nacional por uma ampla maioria. Esta lei, entre outras coisas, proíbe operações de ajuda financeira entre diferentes níveis de governo; estabelece limites para as despesas de pessoal do governo federal e dos governos municipais e estaduais; e requer ainda que limites sejam fixados pelo Senado Federal, segundo a proposta do presidente ao endividamento de cada nível de governo. (…). A lei também determina melhoras significativas no que refere à transparência e à responsabilidade na gestão dos recursos públicos. A legislação complementar sobre penalidades por violação dos dispositivos da Lei de Responsabilidade Fiscal por parte de autoridades públicas (a lei de crimes fiscais), foi aprovada pelo Congresso Nacional. Em junho, o Senado Federal aprovou o Plano Plurianual para 2000-2003 (PPA), que define a estratégia do governo para alocação dos recursos do orçamento federal para os diversos programas de despesas durante este período, objetivando maior previsibilidade, responsabilidade e eficiência nos gastos federais.”
A LRF privilegia os gastos com a dívida pública em detrimento dos demais gastos sociais, por meio do cumprimento de metas de “Superávit Primário”, ou seja, a garantia.
3 Disponível emhttp://www.fazenda.gov.br/portugues/fmi/fmimpe01.asp
4 Disponível emhttp://www.fazenda.gov.br/portugues/fmi/fmimpe06.asp
De que os gastos sociais serão contingenciados para se priorizar o pagamento da dívida. Abaixo reproduzimos vários artigos desta Lei que assim dispõem:
a) ESTABELECIMENTO DAS METAS DE RESULTADO PRIMÁRIO
O chamado “Superávit Primário” corresponde a uma reserva de recursos orçamentários, que se destinariam a outras rubricas orçamentárias. Tal superávit é obtido mediante uma economia forçada que se dá através do contingenciamento de gastos sociais, e se destina a garantir prioritariamente o pagamento da dívida pública. O art. 4º da LRF diz que, a cada ano, o governo terá de estabelecer e cumprir diversas metas, dentre elas a do “Superávit Primário”:
Art. 4º, § 1o Integrará o projeto de lei de diretrizes orçamentárias Anexo de Metas Fiscais, em que serão estabelecidas metas anuais, em valores correntes e constantes, relativas a receitas, despesas, resultados nominal e primário e montante da dívida pública, para o exercício a que se referirem e para os dois seguintes.
Art. 5º, I - O projeto de lei orçamentária anual (...) conterá, em anexo, demonstrativo da compatibilidade da programação dos orçamentos com os objetivos e metas constantes do documento de que trata o §1º do art. 4º;
b) CORTE DE GASTOS SOCIAIS PARA SE ATINGIR AS METAS DE RESULTADO PRIMÁRIO
A fim de garantir o cumprimento da meta de Superávit Primário, o art. 9º da LRF exige um acompanhamento bimestral, prevendo que a administração pública de todas as esferas deverá cortar gastos, mediante “limitação de empenho e movimentação financeira”, caso se verifique que a meta de Superávit Primário esteja ameaçada:
Art. 9º Se verificado, ao final de um bimestre, que a realização da receita poderá não comportar o cumprimento das metas de resultado primário ou nominal estabelecidas no Anexo de Metas Fiscais, os Poderes e o Ministério Público promoverão, por ato próprio e nos montantes necessários, nos trinta dias subsequentes, limitação de empenho e movimentação financeira, segundo os critérios fixados pela lei de diretrizes orçamentárias.
c) IMPEDIMENTO A QUALQUER MEDIDA QUE AFETE O RESULTADO PRIMÁRIO
O privilégio do cumprimento da meta de Superávit Primário se revela também nos art. 14 e 16 da LRF, que estabelecem que a administração pública de todas as esferas.
Não poderá reduzir os tributos pagos pela população, e não poderá aumentar os gastos sociais, caso qualquer dessas medidas venha a prejudicar o cumprimento da meta de Superávit Primário. Trata-se de extremado zelo e
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