Colunas: cantinho do Direito e Esporte

terça-feira, 7 de dezembro de 2010

Terror no Rio

As recentes ações de terrorismo no Rio de Janeiro desencadeadas pelo narcotráfico assustaram como nunca a população e os governantes. A certeza sobre a dimensão do poder dos criminosos e a incerteza sobre a capacidade do Estado e de suas instituições policiais em vencer essa guerra devem nos levar a uma grande reflexão. Não tenho dúvida alguma que a situação no momento vai se controlar, as autoridades vão comemorar e vão fazer do limão uma limonada. Todavia o cidadão esclarecido continuará preocupado e inseguro porque sabe da quantidade das variáveis que envolvem o crime, fenômeno sócio-politico-econômico; aí reside a grandeza do problema !
No Rio, o governo e a mídia, ainda sob o efeito do susto, estão colocando (creio que de forma equivocada) as UPP-Unidade de Polícia Pacificadora como o fato gerador dessa confusão e também como a solução milagrosa para o crime. O secretário Beltrame aposta todas as fichas nesse projeto, que trocou de nome, não é desse governo, é nosso há cerca de 10 anos quando o formulamos e implantamos nas comunidades do Pavão, Pavãozinho e Cantagalo a primeira unidade, com cerca de 250 policiais e que teve como primeiro comandante o então major Carballo, hoje coronel Carballo, atual comandante da Escola Superior de Polícia Militar. À época, a princesa Diana veio ao Rio, subiu o morro, conheceu o projeto, brincou com as crianças e conversou com os policiais. O projeto, inovador, experimental, para ser aplicado em longo prazo é apenas um dos 75 que formulamos e implantamos. É essencialmente solidário e não solitário, ou seja, implica no envolvimento de outras instituições públicas para que levem às comunidades carentes não somente paz, mas também, comida, saúde, trabalho, educação, cidadania. Só policiamento não dá! Ademais implica ainda no emprego de grandes efetivos de policiais, preferentemente voluntários, comprometidos com os objetivos do projeto, que deve tratar de forma desigual os desiguais, dentro dos fundamentos da chamada Polícia Comunitária. Aí pergunto: será que o governo está entrando em todas essas comunidades com esses recursos ? Será que os policiais designados são voluntários e estão preparados para esse trabalho? Claro que não! Falta logística governamental e os policiais em grande parte são novatos, concursados para servirem no interior, sem treinamento específico e trabalhando por imposição do regulamento disciplinar. Com essa conformação o projeto é falho e pode não dar certo! É aconselhável uma reestruturação enquanto há tempo.
Outra questão grave no contexto da (in)segurança pública em nosso país e especialmente no Rio diz respeito ao papel das organizações policiais estaduais. Não temos uma polícia de ciclo completo (ostensiva e investigativa) como ocorre em todo o mundo.São duas meia-policia que acabam não fazendo o papel de uma. É o modelo ‘jabuticaba’ (próprio do Brasil). Se alguém motivado por qualquer sentimento defende esse modelo falido que conteste os números: aqui pouco ou nada se investiga. A taxa de elucidação do homicídio, ou seja, o delito que elimina o nosso bem maior que é vida, não chega sequer a 6%.E os demais delitos? Ridículo, elucidação próxima a zero, sem chance ! Prisões, na esmagadora maioria para os pobres. E aí, com esse vergonhoso índice como defender esse modelo ? Até quando vai perdurar? Quando é que o governo e a classe política vão se mobilizar para, de forma clara, sincera, corajosa enfrentar essa questão, desarquivando os projetos (há cerca de 800 no congresso, principalmente a PEC 181/2003) e promovendo a grande e imprescindível reforma policial no país.
Enquanto isso grande parte dos nossos policiais, individualmente os melhores do mundo e também os mais mal pagos, vão se superando, cobrindo falhas de suas arcaicas instituições, dando em muitos casos suas vidas para defender a sociedade e, por conta de uma minoria desviada, recebendo como recompensa apenas a incompreensão. Os episódios recentes no Rio mostram com muita clareza a Polícia Civil uniformizada realizando ações ostensivas e a Polícia militar, em muitas situações, à paisana, investigando, tudo isso contrariamente a disposição constitucional, que embora sistematicamente violentada e caduca, é vigente. E, no caso, na prática que se vê e até que os governantes se toquem no sentido da mudança, não cabe alternativa que não a aplicação do princípio Socrático de que “se as leis não são boas não devem ser obedecidas, devem ser ignoradas”. Pode?...enquanto isso, sem tais mudanças, aguardemos o Day After.
Josias Quintal

Nenhum comentário:

Postar um comentário